Saturday, January 8, 2011

Esperando chover

No caminhãozinho cheio de barro um pedaço de goiaba e um soldado de plástico. O menino mal andava com o bolso cheio de chumbinho que ele pegou escondido na oficina do avô. Às vezes limpava a goiaba na blusa, às vezes não, conforme o gosto. Ara, se a mãe visse. Era um fim de dia rezado. Já rápido vinha o carro levá-lo, e o acabou que encompassava assistir ao avô trabalhar em silêncio fazendo rodas de carreta. Mas se chovesse era como se colocassem rédeas no acertado das horas e ele tinha até o dia novo na casa dos avós. Inté a chuva passar e o barro secar e criar rastros e rugas no chão, machucando o pé de quem anda descalço, sem ferradura. Zaz no galope da vassoura que Nana procurou a tarde toda. "Estou fazendo desuso, Nana", dizia ele com a boca cheia de goiaba e de boa vontade. Menino não gostava do pai que vinha vindo e, visto que a chuva havia empacado numa nuvem muito sem cumulo, molhou o rosto com água, fazendo uns pingos na blusa e na bermuda. O vô buscou na gaveta um par de roupa velha do ano passado e resmungou "deixa o seu pai te pegar molhado", mascando fumo. E ele virava o corpo pra lá e pra ca, bem moleza. Saiu correndo quando o carro chegou e Nana teve que buscá-lo detrás do pé de jaca fedido e mais gostoso do mundo. Uma catedral de coisas passou na cabeça do menino. Foi arrastando com o chinelinho de couro fazendo barulho e chispando com o chão. Nana sussurrou no ouvido que era só guardar os temores num embrulho que o sonho amaciava. Ele olhou e acenou uma vez com o carro já ligado. 

2 comments:

  1. Surpresa ao saber que o blog ainda existe.
    Feliz!
    Beijos, querida.

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  2. Oi, Juliana! Quanto tempo!
    A primeira versão eu deletei, a segunda, como constatou, ainda está em banho-maria. :)

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